O peixe de ouro

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Era uma vez um pescador que vivia com a mulher numa velha cabana à beira-mar. Todos os dias partia no seu barco, feliz por reencontrar as ondas coroadas de espuma, por sentir o sol acariciar-lhe a face e o vento soprar-lhe docemente nos cabelos. Por vezes, maravilhado com um pôr do sol, quedava-se, extasiado pela beleza do mundo, e esquecia-se até de lançar as redes.

Numa manhã em que o mar estava particularmente calmo, lançou as redes à água límpida, dando graças ao céu por tão belo dia. Teve muita dificuldade em puxá-las. Puxou com todas as suas forças, pensando que apanhara vários peixes grandes. Mas, no meio das redes, havia um único peixe de escamas douradas. Ficou muito surpreendido quando o peixe lhe falou com voz humana:

— Peço-te, pequeno pescador, deixa-me voltar para o mar. Dá-me a minha liberdade e dar-te-ei o que quiseres.

O pescador pegou nele delicadamente e pô-lo de novo na água.

De volta a casa, contou a sua aventura à mulher, que ficou muito zangada:

— Ao menos, podias ter-lhe pedido pão! Há muitos dias que não temos pão. Volta lá e pede-lhe pão bem fresco.

O pescador voltou ao lugar onde tinha largado o peixe. Uma brisa suave soprava no mar e as pequenas ondas salpicavam docemente o casco do barco.

— Peixe, peixinho de ouro, vem cá! Vira a cabeça p’ra mim, minha mulher quer assim!

O peixe apareceu e perguntou:

— O que me quer ela?

— Acha que eu deveria ter-te feito um pedido quando estavas preso na minha rede. Queria que nos desses pão.

— Volta para casa — respondeu-lhe o peixe. — Ela já tem o que queria.

Ao chegar a casa, o pescador encontrou a mulher ocupada a empilhar formas de pão e sacos de farinha a um canto da cabana.

— Estás a ver como fiz bem em mandar-te lá? — perguntou ao marido.

Passado um mês, porém, a mulher do pescador começou a queixar-se.

— Devias ter-lhe pedido uma casa. Olha para esta cabana miserável, quase não se aguenta de pé! Na verdade, o que nos faz falta é uma boa casa. Vai ter com o peixe de ouro e pede-lhe uma.

O pescador voltou, contrafeito, ao lugar onde tinha largado o peixe. O sol desaparecera por detrás das nuvens e o vento tinha-se levantado, fazendo oscilar o barco.

— Peixe, peixinho de ouro, vem cá! Vira a cabeça p’ra mim, minha mulher quer assim!

O peixe tirou a cabeça da água e perguntou-lhe:

— E o que quer ela agora?

— Quer uma casa. A nossa cabana está muito velha.

— Volta para casa. Ela já tem o que desejava.

Ao chegar a casa, o pescador encontrou a mulher com um vestido novo, na soleira de uma grande casa de pedra. Atrás de um belo pomar, viu igualmente uma capoeira e um estábulo.

— Vês, — disse-lhe a mulher — fiz bem em mandar-te lá.

Mas, duas semanas depois, a mulher do pescador voltou a queixar-se:

— Esta casa é demasiado pequena. Precisamos mas é de um castelo. Vai de novo ter com o teu peixe e diz-lhe que quero morar num castelo.

Tanto o atormentou, que o pescador voltou ao mesmo lugar. O vento soprava agora em fortes rajadas e grandes ondas abanavam o barco por todos os lados.

Contrafeito, o pescador chamou o peixe de ouro:

— Peixe, peixinho de ouro, vem cá! Vira a cabeça p’ra mim, minha mulher quer assim!

O peixe tirou a cabeça da água e perguntou-lhe:

— O que quer ela desta vez?

— Quer um castelo. Acha a casa pequena demais.

— Volta para casa — respondeu o peixe. — Ela já tem o que queria.

Ao chegar a casa, o pescador viu a mulher magnificamente vestida, no pátio de um grande castelo, que estava rodeado por um belo parque. Dezenas de criados atarefavam-se por todo o lado.

— Vês como fiz bem em mandar-te lá?

Mas, no final da semana, a mulher acordou-o uma manhã com um forte abanão:

— Temos de ser os soberanos deste país. Corre e pede ao peixe que nos faça rei e rainha.

— Mas eu não quero ser rei — disse-lhe o pescador.

— Mas eu quero ser rainha. Vai depressa dizer-lhe que quero governar o país.

Triste e com o coração pesado, o pescador voltou à margem. Relâmpagos flamejantes percorriam o céu escuro e ondas ameaçadoras por pouco não viraram o barco.

— Peixe, peixinho de ouro, vem cá! Vira a cabeça p’ra mim, minha mulher quer assim!

O peixe tirou a cabeça da água e perguntou-lhe:

— O que mais quer ela?

— Quer ser rainha. Quer que todos a sirvam.

— Volta para casa — disse-lhe o peixe. — Ela já tem o que exigiu.

Ao chegar a casa, o pescador viu um palácio esplêndido, guardado por inúmeros soldados. A mulher encontrava-se no interior, sentada num trono enorme. Tinha na cabeça uma pesada coroa de ouro, incrustada de diamantes, e trazia um vestido sumptuoso, semeado de finas pérolas.

— Vês como fiz bem em mandar-te lá? — perguntou ao vê-lo.

Mas, nessa noite, na grande cama coberta de peles, a mulher do pescador não conseguia dormir. Perguntava-se o que mais poderia obter do peixe. E quando a alvorada iluminou o céu, pôs-se a gritar de cólera:

— Como é possível? Quando quero dormir é que o sol se levanta, e sem a minha autorização. Vai depressa ter com o peixe e diz-lhe que desejo que os astros me obedeçam.

E ordenou aos guardas que o pescador fosse posto fora de portas. Pesaroso, o pescador voltou ao mar.

Uma tempestade enorme desabara sobre o oceano. As ondas rebentavam em cima do barco do pescador, que não o conseguia controlar. Várias vezes chamou o peixe com todas as suas forças, enquanto a violência do vento lhe abafava a voz:

— Peixe, peixinho de ouro, vem cá! Vira a cabeça p’ra mim, minha mulher quer assim!

O peixe tirou, por fim, a cabeça da água e perguntou:

— Mas o que mais pode ela ainda querer?

— Quer reinar sobre o universo inteiro.

— A tua mulher nunca se sentirá satisfeita. Adeus, caro pescador, nunca mais voltaremos a ver-nos.

Ao chegar a casa, o pescador viu que o palácio tinha desaparecido e que, no seu lugar, se encontrava de novo a cabana decrépita. A mulher choramingava, envergando o seu velho vestido remendado.

— Não chores — disse o pescador. — Não eras mais feliz quando eras rainha. A maior felicidade consiste em estar-se contente com o que se tem.

E partiu, feliz, para pescar o alimento de todos os dias no mar límpido e tranquilo.

Johanna M. Coles; Lydia M. Ross
L’Alphabet de la Sagesse
Paris, Albin Michel Jeunesse, 1999
(Tradução e adaptação)

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