O presente de Natal do rei Wod

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O rei Wod era muito, muito rico. Tinha tanto dinheiro que podia encher a meia de Natal de todas as crianças do país – incluindo a tua, se lá morasses – e ainda lhe sobraria muito dinheiro.

Por que razão, então, odiava ele o Natal? A razão era esta. O Rei Wod queria um presente-supresa na manhã de Natal. Só isso? Aha… não esqueçamos como era rico. Todos os anos, era a mesma coisa. Fosse qual fosse o presente que recebia, por mais maravilhoso que fosse, nunca era novidade.Por exemplo:

Um cavalo com cascos de muitas cores para andar no arco-íris.

Um livro de respostas a todas as perguntas dos professores.

Um cesto de piquenique que brilhava no escuro quando o levávamos a uma festa depois da meia-noite.

Uma almofada para nos adormecer ao som de uma canção.

Uma poça de água para saltar dentro de casa sem molhar a carpete…

Para quê mais exemplos? “Já tenho um desses”, dizia sempre o Rei Wod.

Um dia, numa manhã de Natal bem cedo, mesmo antes de o sol nascer, o Rei perdeu a paciência. Deu um pontapé no trono, rasgou o manto em dois e atirou a coroa pela janela.

— Será que ninguém me pode trazer um presente-surpresa? — gritou. — Chamem o feiticeiro real!

— Aqui me tendes, Majestade.

— Não fiques aí especado! Faz alguma coisa. Isto é uma ordem!

ABRA – CA – ZAM!

— Como?

Num abrir e fechar de olhos, o Rei Wod encontrou-se numa floresta escura, coberta de neve.

— Onde estou? No Pólo Norte? — perguntou. — Esperem até eu regressar ao palácio. Aquele feiticeiro não sabe com quem se meteu.

Agora, porém, quem estava em apuros era o Rei Wod. A neve atingia-lhe os joelhos nalguns sítios e noutros chegava-lhe mesmo aos sovacos. O Rei não sabia onde estava. Em breve estava tão hirto e gelado como um pingente de neve.

— Se não me mexer depressa, acabo por me transformar num pingente. Um pingente gigante. Alto lá, será que vejo uma casa algures?

Suspirando de alívio, caminhou pesadamente até chegar a uma cabana minúscula, com o telhado coberto de neve, situada na orla da floresta. A cabana estava vazia. Não que estivesse abandonada. Havia uma lareira acesa, comida na despensa, e mobília confortável na sala de estar.

— Onde estará o dono? — perguntou o Rei. — E porque não há decorações de Natal e uma árvore com luzinhas?

Na cabana não havia o menor indício de Natal. Excepto um calendário do Advento em cima do fogão de sala. Estava aberto no dia 24 de Dezembro.

— É véspera de Natal — disse o Rei.

Isto tornou a cabana ainda mais deserta. O Rei sentia-se só. Será que iria passar o primeiro Natal sozinho da sua vida?

— É melhor aquecer-me, para começar. E tenho de me manter ocupado.

Foi divertido cortar uma árvore na floresta e colocá-la num canto da sala, especialmente depois de ter encontrado uma grande caixa com decorações de Natal no armário debaixo das escadas. Também foi divertido pendurá-las, bem como acender a lareira e pôr a mesa para a ceia de Natal.

Depois de ter feito isto tudo, o Rei desenhou um cartão de Natal para o dono da cabana e colocou-o em cima da chaminé. Fez, em seguida, uma embalagem de oferta, dentro da qual colocou um bilhete:

Este espaço está reservado para um presente do Rei Wod. Pode ser um livro de respostas a todas as perguntas dos professores, um cesto de piquenique que brilha no escuro quando o levamos a uma festa depois da meia-noite, um cavalo com cascos multicoloridos para andar nos arco-íris… O que lhe apetecer. A escolha é sua.

Colocou, depois, a caixinha debaixo da árvore de Natal. Por último, pôs a mesa para mais uma pessoa. — Nunca se sabe… — suspirou.

Adormeceu profundamente diante da lareira. A claridade do dia acordou-o. A claridade e o tilintar de campainhas de trenó. A porta abriu-se de repente e um homem gorducho entrou. Exatamente o tipo de pessoa que esperaríamos ver num sítio como este. Como trazia geada nas sobrancelhas, gelo na barba, flocos de neve a derreter no fato vermelho, e um saco vazio, o Rei Wod demorou algum tempo a reconhecê-lo.

— Pai Natal! — arquejou. — Como está?

— Quem é o senhor?

— Sou o Rei Wod. Desculpe esta…

— O Rei Wod?

O Pai Natal olhou o seu visitante com espanto.

— Isso quer dizer que a carta do feiticeiro era verdadeira? A carta que dizia que ia trazer-me…

A voz do Pai Natal foi-se apagando, enquanto percorria com os olhos as decorações, a mesa de jantar, o cartão na chaminé, e o presente debaixo da árvore.

— Como sabia? — exclamou este.

— Sabia? — perguntou Wod. — Sabia o quê?

— Que nunca tive um Natal a sério?

— Nunca?

— Estou sempre demasiado ocupado antes do Natal. Depois fico demasiado cansado. E agora Vossa Majestade organizou tudo para mim. Que Deus o abençoe! Estou-lhe tão grato. Como se lembrou de um presente-surpresa tão bonito?

— Presente-surpresa?

— O meu próprio Natal — respondeu o Pai Natal. — É o meu primeiro Natal.

— É o primeiro que ofereço — disse o Rei, pensativo. Mas deu-se logo conta de que não seria o último. Wod nunca esqueceu a lição que o seu feiticeiro lhe deu. Faz sentido que, quando se é um rei que tem tudo, receber um presente-surpresa é difícil. Mas dar um é fácil.

Algum tempo depois, quando nomeou o feiticeiro seu Primeiro-Ministro, o Rei disse:

— Só há um pequeno problema. O que devo pôr na caixa que deixei debaixo do pinheiro? O Pai Natal não me disse de que presente gostava mais.

— É simples — sorriu o feiticeiro. E sussurrou algo ao ouvido do Rei Wod.

Adorava dizer-vos o que ele sugeriu. Mas isso ia estragar a surpresa.

Chris Powling Sally Grindley (org.)
Christmas stories
London, Kingfisher, 1994

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