O Rei Arquimedes está desempregado
O Rei Arquimedes I estava muito satisfeito. Por instantes, a sua vida parecia-lhe um conto de fadas. Tal como o pai tinha previsto, Arquimedes casara com a mais bela das princesas e tinham tido o mais querido dos filhos, o Príncipe Emílio, a quem chamavam Mimito. No seu castelo de oiro maciço, passavam dias felizes a cheirar o perfume das rosas – que eram a paixão do rei e que um exército de jardineiros vigiava atentamente.
O pequeno Mimito adorava o castelo, que tinha uma porta em oiro maciço e caves cheias de tesouros e pedrarias, e jogava ao berlinde com diamantes de facetas maravilhosos. A família real andava literalmente sobre oiro, tanto mais que as rodas das carruagens também eram feitas desse metal.
No entanto, mesmo quando se é rei, o céu pode cair-nos em cima da cabeça. E foi assim que, um dia, o Rei Arquimedes recebeu a visita do chefe dos reis que, enquanto bebia o chá, não cessava de enrolar os seus longos bigodes cinzentos.
— Estamos em crise e somos cada vez menos. Já ninguém quer reis. Dizem que é um emprego em vias de extinção.
Subitamente, deu uma palmada nas costas de Arquimedes:
— Não te aflijas. És esperto e encontrarás de certeza um outro emprego.
E acrescentou:
— Dá-te por feliz por não te terem cortado a cabeça.
O Rei Arquimedes viu-se assim desempregado. Deixou o castelo e alugou uma casinha confortável, mas sem espaço para os luxos a que estava habituado. Só tinha três telefones em vez de vinte e seis e, em vez de setenta e cinco criados, tinha apenas um criado velho, que tossia constantemente, e cuja única função era levar ao rei, logo de manhã, o jornal e um ramo de rosas. Todas as manhãs, o Rei Arquimedes lia os anúncios de emprego. Havia pedidos para chefes de computadores, fabricantes de saunas, especialistas em robôs, criadores de póneis, perfumistas e empregados de limpeza. Ninguém pedia reis. Mas o rei não desistia. Telefonava na mesma e respondia a perguntas como:
— Já trabalhou em quê?
— Já trabalhei como rei.
— E eu já trabalhei como papa — respondiam do outro lado e desligavam.
Em breve, o dinheiro começou a faltar. Era preciso fazer sacrifícios: o rei deixou de comprar rosas e croissants, o seu único luxo, embora continuasse a comprar jornais, já que precisava de procurar emprego. Venderam os tesouros do reino, as rodas de oiro fino e os berlindes-diamantes facetados do pequeno Emílio, conhecido por Mimito.
O pequeno príncipe estava muito inquieto:
— O que irá acontecer em seguida? Será que o nosso velho criado vai deixar-nos? O que vai ser de nós? Ainda teremos que comer?
E pensava, com nostalgia, no jardim das trinta e seis mil rosas que estava sempre presente no seu coração. Quanto ao Rei Arquimedes, estava mais triste do que triste.
— Não passo de uma carriça. Ninguém me quer.
E dizia à rainha:
— Não tenhamos ilusões. Estou velho e já ninguém me quer. Nunca mais encontrarei trabalho.
E arrastava-se pela casa, nas suas meias tristes, sem se barbear e sem usar a coroa. Em alguns meses, tinha diminuído quinze centímetros.
Uma noite, à lareira, pegou na coroa, limpou-a com tristeza, lembrando-se dos seus tempos de grandeza… e respirou o odor da última rosa, a única que tinha conservado… À força de ser rei, tinha a impressão de nunca ter feito mais nada na vida. Tinha-se esquecido de tudo. Todo o seu passado tinha sido aspirado pelo seu desgosto. Tinha-se realmente esquecido de tudo. Como já não era rei, sentia que já não era nada…É sempre difícil ver o nosso pai assim triste. O pequeno Príncipe Emílio tentou fazê-lo mudar de ideias mas não conseguiu.
Na escola, as coisas também não lhe estavam a correr bem. À força de ver o pai triste, Emílio também começou a ficar triste. Quando estamos tristes, não conseguimos trabalhar. Na escola, já não passava dos “Suficiente” e, em breve, começou a receber testes com a classificação de “Sofrível”. Nas aulas de Desenho, só desenhava torres horríveis, todas negras e cheias de inimigos mascarados lá dentro, ou então desenhava monstros com dentes pavorosos, que derrubavam reis sem coroa, minúsculos.
Foi então que o Rei Arquimedes resolveu enfrentar as dificuldades e ajudar o filho. Não que fosse forte a Matemática: nunca tinha conseguido contar as rosas do jardim. Para as aulas de Desenho comprou guaches e desenhou um castelo azul e rosa. Enquanto pintava, o seu coração desabrochava. De repente, já não conseguia parar. E pôs-se a pintar, a pintar, a pintar. Decorou todas as paredes da casa com os seus quadros. A rainha espantava-se com os quadros do rei, que tinha recuperado a sua altura e a alegria de viver. Este corria pelo jardim e berrava a plenos pulmões:
— Sou pintor! Sou um grande pintor! Viva!
Decidiu vender a coroa no mercado do bairro e comprou um cavalete novo. O criado estava encantado. Ocupava-se agora a lavar os pincéis e a posar. Quando Arquimedes queria pintar um par de pés ou um cavaleiro romano, o criado fazia pose. E sabem o que o rei desenhava melhor? Rosas. Bastava lembrar-se do seu jardim de mil odores…
O pequeno Príncipe Mimito estava feliz por ver que os quadros se vendiam, que havia dinheiro em casa e que o pai estava mais corado.
— Percebi finalmente uma coisa, filho. Na vida, não se é só rei. Também podemos ser pintores e tudo o que quisermos. Se quisesse, podia ser astrónomo, pianista ou perfumista. O que achas?
O pequeno príncipe não respondeu, mas achava que o pai tinha recuperado a confiança ao voltar a trabalhar. E isso era o essencial.
Se um dia te cruzares com Arquimedes, reconhecê-lo-ás por certo. Não por causa da coroa, que já vendeu, mas por causa da luz que existe no fundo dos seus olhos verdes. Há quem diga que é oiro o que lá brilha.
* * * *
Com 14% de vítimas em França, o desemprego tornou-se uma realidade social. É um momento difícil, acompanhado por períodos de dúvida e de questionamento. Mesmo quando temos confiança em nós e nas nossas capacidades, passamos momentos de depressão, sobretudo se tivermos filhos. As crianças sentem, com muita acuidade, as nossas angústias e inquietações. É por isso que é melhor dizer-lhes tudo com clareza do que deixá-las fantasiar.
Fale calmamente com o seu filho, sem mostrar uma angústia muito grande, sem auto-compaixão e sem discursos macro-económicos. Diga-lhe que deixou o seu emprego e que vai procurar outro. Tenha uma atitude positiva. Não se comporte como quem foi rejeitado. O seu filho não conseguiria suportar esse peso e reagiria mal.
Se ele sentir a sua angústia e o seu mal-estar, talvez o rejeite num primeiro momento. É normal: a criança está a proteger-se por detrás de uma carapaça. Não veja nisso desprezo: ela não o abandonou nem o rejeitou. Tenta apenas proteger-se.
Na medida do possível, não leve o seu filho até ao Centro de Emprego, não o matraqueie com as suas angústias nem seja amargo. Nunca lhe diga: “Já ninguém me quer”; “Estou velho demais, já não sirvo para nada”. A armadilha em que pode cair é descrever-lhe o mundo do trabalho como uma selva. Não o pressione: “Vais ver, vai acontecer-te a mesma coisa….”
No que diz respeito aos resultados escolares, tudo pode acontecer. As notas podem baixar, porque a criança identifica-se com o fracasso do pai/da mãe, mas também pode acontecer que ela invista na escola, que se torna um lugar onde todas as compensações são possíveis.
Mostre-se combativo, tanto por si como pelo seu filho. Fale-lhe em termos positivos das entrevistas, das suas expectativas, dos contactos que está a planear. Evite arrastar-se de manhã e vista-se como se fosse trabalhar. As mães podem investir mais na casa nestas alturas, ir buscar os filhos à escola, etc.
Diga-lhe que quer sejamos reis, príncipes ou chefes de empresa, podemos perder o emprego. Se tudo correr bem, o período sem trabalho pode ser curto. Talvez ele tenha colegas a quem aconteceu o mesmo. Nestes momentos, é difícil os pais estarem bem dispostos. Às vezes, o período de desemprego é longo e então inquietamo-nos. Vemo-nos na rua, a mendigar. São angústias que o pequeno príncipe também conheceu. Mas, como vimos, o pai dele também encontrou um novo emprego. Muito diferente daquele que imaginávamos.