Esta noite, Carneirinho não tem fome, só tem muito sono. Passou o dia inteiro a brincar, a correr e a saltar por todo o lado, e agora, sentado na sua cadeirinha, adormeceu com o nariz em cima do prato dos espinafres.
A mãe pega nele ao colo com muito cuidado para não o acordar e leva-o para o quarto.
Muito devagar, deita o Carneirinho na cama, mas ele acorda e abre os olhos.
— Não tenho sono nenhum! Eu ainda quero brincar mais!
A mãe explica que são horas de dormir e que os brinquedos também precisam de descansar. Beija-o com muita ternura e deseja-lhe, assim como ao seu ursinho, sonhos bonitos.
Carneirinho encolhe os ombros. Como é que há-de de sonhar se não tem sono? E tenta convencer a mãe:
— Por favor, deixa-me brincar só mais um bocadinho…
A mãe acaricia-lhe a cabeça cheia de caracóis:
— Para seres um carneiro grande como o teu pai, lindo e cheio de força, precisas de ter sono. Tu bem sabes que dormir faz crescer. Vamos fazer um jogo: fechas os olhos e imaginas um rebanho de cordeirinhos brancos muito alegres, a saltarem uma cancela, uns atrás dos outros. Quando o décimo carneiro tiver saltado, já estás a dormir.
Carneirinho faz como a mãe disse. Fecha os olhos, apertando as pálpebras com força, e espera.
Primeiro, não acontece nada. De repente, aparece a espreitar à janela a cabeça de um cordeiro branco, com um gorro vermelho e cara de brincalhão. Com um ar intrigado, espreita para dentro do quarto e pergunta:
— Olha, deixas-me entrar?
— Com certeza — responde Carneirinho, surpreendido.
O cordeirinho branco de gorro vermelho salta para o tapete. Corre para a arca dos brinquedos, abre a caixa dos cubos e começa a construir uma torre muito alta.
Ainda não tinha acabado, quando um segundo cordeiro branco bate à janela.
— Também posso entrar? — pergunta.
— Claro — responde Carneirinho, já sem se admirar.
Este cordeiro traz calçadas umas lindas botas amarelas de borracha. Levanta as pernas e salta com destreza para dentro do quarto. Corre, decidido, para a arca dos brinquedos e tira um jogo de construções.
Enquanto escolhe as peças e hesita entre construir uma casa, um avião, ou uma nave espacial, um terceiro cordeirinho branco mostra a ponta do focinho atrás do vidro.
— Entra — diz Carneirinho — faz de conta que estás em tua casa.
Este cordeiro é mais desastrado e estatela-se em cima do tapete. Catrapumba! A torre de cubos desmorona-se debaixo dele. Estonteado, pega num livro para se recompor.
Enquanto vira as páginas, um quarto cordeiro pula para dentro do quarto, mesmo sem ser convidado. Pega no violino e põe-se a tocar uma música endiabrada.
Imediatamente a seguir, surge o quinto, de cartola, muito elegante. Logo depois, o sexto aterra suavemente, com um guarda-chuva verde a servir de pára-quedas.
O sétimo cordeiro traz um cachecol garrido; o oitavo já está preparado para saltar, e o nono não deve estar longe, porque o décimo já está a chegar.
Num piscar de olhos, dez cordeiros brancos, dez cordeirinhos alegres e despreocupados, andam às voltas no quarto. Dez cordeirinhos traquinas andam aos pinotes pelo quarto todo. Estes malandros põem o comboio eléctrico a andar, jogam ao berlinde, à bola ou à cabra-cega, organizam corridas de carros e concursos de saltos de obstáculos.
O cordeiro número quatro toca sem parar no violino dourado, e os números nove e dez, fazem uma barulheira infernal.
Que algazarra! Carneirinho já está farto.
— Parem com isso! — grita ele. — Chega! Não consigo dormir com esta barulheira!
Dez cabeças encaracoladas viram-se para ele:
— Méé, méé, méé! Foste tu que nos chamaste. Tens de saber o que queres!
— Quero dormir — diz Carneirinho — se não nunca mais vou ser grande e forte como o meu pai.
Então, em silêncio, os alegres cordeirinhos brancos desaparecem um a um pela janela, da mesma forma que vieram, à excepção do primeiro, o do gorro vermelho, que fica para trás:
— Sabes para onde foram? — pergunta Carneirinho.
— Para o país dos sonhos — responde o cordeiro do gorro vermelho. — Vem, eu levo-te para lá também.
Carneirinho dá a pata ao cordeiro branco, que a aperta com muita força, e voam pela janela fora em direcção ao céu estrelado. Voam tão rápido e para tão longe, que se confundem com duas estrelinhas a brilhar na noite.
Antes de se deitar, a mãe de Carneirinho vem dar-lhe um último beijo. Quando entra no quarto, em bicos de pés, fica muito admirada ao ver os brinquedos espalhados pelo chão. Porém, Carneirinho dorme profundamente, com um gorro vermelho na cabeça. Em cima da colcha, um raio de luar faz brilhar o seu violino dourado…
Anne-Isabelle le Touzé
Un, deux trois, sommeil!
Paris, Actes Sud, 1998
Tradução e adaptação